terça-feira, 31 de março de 2009

POEMA À MÃE

No mais fundo de ti
Eu sei que te traí, mãe.

Tudo porque já não sou
O menino adormecido
No fundo dos teus olhos.

Tudo porque ignoras
Que há leitos onde o frio não se demora
E noites rumorosas de águas matinais.

Por isso, às vezes, as palavras que te digo
São duras, mãe,
E o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas
Que apertava junto ao coração
No retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,
Talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
Que todo o meu corpo cresceu,
E até o meu coração
Ficou enorme, mãe!

Olha - queres ouvir-me? -
Às vezes ainda sou o menino
Que adormeceu nos teus olhos;

Ainda aperto contra o coração
Rosas tão brancas
Como as que tens na moldura;

Ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
No meio do laranjal...

Mas - tu sabes - a noite é enorme,
E todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura
Deis às aves os meus olhos a beber.

Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo as rosas.
Boa Noite. Eu vou com as aves.

de Eugénio de Andrade

sexta-feira, 27 de março de 2009

PALAVRAS MÁGICAS



As palavras mágicas imitam o pensamento e disfarçam a vacuidade de ideias: são usadas por quem finge que pensa usando palavras e expressões que leu o ouviu algures, sem que se tenha dado realmente ao trabalho de pensar - nem sequer uma vez, quanto mais outra vez. Eis alguns exemplos: "modernidade", "construção", "problematizar", "problemática", "mediar", "mediatizar", "questionar", "questão", "questionamento", "paradigma", "identidade", "dimensão". Nem sempre estas palavras são usadas como magia lexical, mas a probabilidade de o serem é tanto maior quanto maior for a sua frequência por centímetro quadrado de texto.
Por exemplo, qual é a diferença exactamente entre um problema e uma problemática? Apenas a impressão de maior vagueza, e portanto de nos safarmos melhor usando palavras prestigiantes sem dizer coisa alguma de palpável. Um problema é algo razoavelmente definido que nos exige pelo menos uma tentativa de solução, e cuja solução depende em grande medida de sermos capazes de o formular com precisão. Uma problemática, ao invés, é um novelo arbitrário de palavras que convidam apenas à aristocrática dissertação ociosa e pretensamente culta, onde nenhuma ideia susceptível de discussão genuína se encontra.
E o que é um paradigma? No seu uso corrente, é apenas um modelo de algo. Leibniz é um modelo ou paradigma de filósofo, Bach de músico. Mas, para nossa desgraça e felicidade de mágicos lexicais, Thomas Kuhn (1922-1996) envolveu esta mesma palavra em magia negra, mudando-lhe o significado e caindo no goto dos preconceitos relativistas actuais: "paradigma" é agora uma palavra mágica que sugere sofisticação intelectual e a superação de suposta ilusões objectivas. Pretensas ilusões que nunca são cuidadosamente refutadas: a magia da palavra é em si suficiente e apenas se presume que é inculto quem declarar que não era realmente verdade que a Terra estava imóvel no tempo de Ptolomeu só porque ele e outras pessoas assim o pensavam. Do ponto de visto do dogma contemporâneo, é tudo uma quastão de paradigmas: cada época histórica tem o seu. Ironicamente, o paradigma da mentalidade actual é pensar que cada época histórica tem o seu próprio paradigma ou maneira incomensurável de ver as coisas, mas esta mesma ideia não é surpreendentemente vista como um mero paradigma, mas antes como a verdade imparadigmática sobre os paradigmas dos outros. É mesmo magia.
"Mediar" e "mediatizar" são mais dois exemplos de afasia cognitiva. São termos que dão uma aparência de susbtância ao tipo de trabalho intelectual que na glória universitária de antigamente se chamava honestamente "corte e costura": consiste em tirar umas palavras daqui e outras dali, misturar tudo e servir triunfalmente como reflexão original o que não passa de rugurgitação ritual do que os outros digeriram. Chama-se também "dissertação" a este canibalismo do verbo alheio.
Para pensar outra vez é preciso começar por eliminar o entulho verbal das palavras mágicas, e quanto mais depressa o fizermos, melhor.

"de Desidério Murcho" (Filósofo, em "Pensar outra vez", Jornal Público de 24.02.2009)

A DEFESA DO POETA

Senhores jurados sou um poeta
um multipétalo uivo um defeito
e ando com uma camisa de vento
ao contrário do esqueleto

Sou um vestíbulo do impossível um lápis
de armazenado espanto e por fim
com a paciência dos versos
espero viver dentro de mim

Sou um código o azul de todos
(curtido couro de cicatrizes)
uma avaria cantante
na maquineta dos felizes

Senhores banqueiros sois a cidade
o vosso enfarte serei
não há cidade sem o parque
do sono que vos roubei

Senhores professores que puseste
a prémio minha rara edição
de raptar-me em crianças que salvo
do incêndio da vossa lição

Senhores tiranos que do baralho
de em pó volverdes sois os reis
sou um poeta jogo-me aos dados
ganho as paisagens que não vereis

Senhores heróis até aos dentes
puro exercício de ninguém
minha cobardia é esperar-vos
umas estrofes mais além

Senhores três quartos cinco e sete
que medo vos pôs na ordem?
que pavor fechou o leque
da vossa diferença enquanto homem?

Senhores juízes que não molhais
a pena na tinta da natureza
não apredejeis meu pássaro
sem que ele canta minha defesa

Sou uma imprudência a mesa posta
de um verso onde o possa escrever
ó subalimetados do sonho!
a poesia é para comer.

de Natália Correia

sábado, 21 de março de 2009

CÂNTICO NEGRO

"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olhos-os com os olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre À minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Porque me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois, sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha loucura!
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca princípio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me de piedosas intenções,
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou,
É uma onda que se levantou,
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!

de José Régio

sexta-feira, 20 de março de 2009

TODOS OS HOMENS SÃO MARICAS QUANDO ESTÃO COM FEBRE


Pachos na testa, terço na mão
Uma botija, chá de limão
Zaragatoas, vinho com mel
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher
Ai Lurdes, Lurdes, que vou morrer
Mede-me a febre, olha-me a goela
Cala os miúdos, fecha a janela
Não quero canja, nem salada
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada
Se tu sonhasses, como me sinto
Já vejo a morte, nunca te minto
Já vejo o inferno, chamas, diabos
Anjos estranhos, cornos e rabos
Vejo os demónios, nas suas danças
Tigres sem listras, bodes de tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes, que foi aquilo!
Não é a chuva, no meu postigo
Ai Lurdes, Lurdes, fica comigo
Não é o vento, a cirandar
Nem as vozes, que vêm do mar
Não é o pingo de uma torneira
Põe-me a santinha, à cabeceira
Compõe-me a colcha, fala ao prior
Pousa o Jesus, no cobertor
Chama o doutor, passa a chamada
Ai Lurdes, Lurdes, nem dás por nada
Faz-me tisanas, e pão-de-ló
Não te levantes, que fico só
Aqui sozinho a apodrecer
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer

de António Lobo Antunes

terça-feira, 17 de março de 2009

AS PESSOAS SENSÍVEIS

As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinha outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinha outra

"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
e não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão"

Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito

Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.

de Sophia de Mello Breyner

FRASEADOR

Hoje eu completei oitenta e cinco anos. O poeta nasceu de treze. Naquela ocasião escrevi uma carta aos meus pais, que moravam na fazenda, contando que eu já decidira o que queria ser no meu futuro. Que eu não queria ser doutor. Nem doutor de curar nem doutor de fazer casa nem doutor de medir terras. Que eu queria era ser fraseador. Meu pai ficou meio vago depois de ler a carta. Minha mãe inclinou a cabeça. Eu queria ser fraseador e não doutor. Então, o meu irmão mais velho perguntou: mas esse tal de fraseador bota mantimento em casa? Eu não queria ser doutor, eu só queria ser fraseador. Meu irmão insistiu: Mas se fraseador não bota mantimento em casa, nós temos que botar uma enxada na mão desse menino pra ele deixar de variar. A mãe baixou a cabeça um pouco mais. O pai continuou meio vago. Mas não botou enxada.

de Manoel de Barros

segunda-feira, 9 de março de 2009

OS DIREITOS DOS PAIS


Agora toda a gente fala nos direitos dos filhos e se esquece dos direitos dos pais.

Nunca, como agora, se discutiu tanto a parentalidade – a competência para exercer a função de pai e de mãe – num contexto social em que a educação na família se tornou cada vez mais necessitada de reconhecimento social: hoje toda a gente emite opiniões sobre o que é ser “bom” pai ou dá conselhos sobre a melhor forma de educar os mais novos. Acima de tudo, perdeu-se muito do bom senso, da intuição e do reconhecimento das experiências passadas como fontes inspiradoras da educação: por isso os pais de hoje hesitam ou têm receio de expressar as suas dúvidas ou, o que é mais grave, temem mostrar as suas convicções. A fragilização do elo conjugal e o culto e idealização das crianças e adolescentes (por uma sociedade que despreza os idosos e glorifica a juventude) por certo sustenta este temor de muitos progenitores actuais.

Eu acho que os pais devem lutar pelos seus direitos.

Em primeiro lugar, o direito de poder expressar os seus pontos de vista sem medo, de forma informal, sem necessidade de estruturas que os dizem representar e que não os ouvem: que direito têm certas associações para falar em nome dos pais, se a sua representatividade é diminuta e se, sobretudo, não fomentam a troca de impressões entre famílias? O que é crucial é que os pais ouçam outros progenitores em circunstâncias de vida semelhantes, porque uma família tem diversas áreas de competência e o que uma consegue resolver deve partilhar.

Em segundo lugar, os pais devem também poder mudar de opinião. Alguns pensam que não, julgam que educar é dizer sempre o mesmo, mas erram: mudar de ideias é uma prova de progresso e de autocontrolo: há que procurar ser coerente, mas o medo da inconsistência é um mito moderno e só não muda de opinião quem não tem ideias.

Depois, é bom adiar algumas acções dos pais, para reflectir e para dar possibilidade aos filhos de encontrarem o seu próprio caminho. Uma educação demasiado protectora não conduz à autonomia e faz com que os descendentes fiquem sempre à espera da opinião dos pais, não sendo capazes de diferenciar. No meu livro A Razão dos Avós, procurei demonstrar como a imaturidade de muitos pais de hoje deriva da ausência de procura de autonomia, por via de uma educação demasiado “camarada”, que não permitiu a construção de espaço de liberdade e de aventura, os únicos capazes de fazer crescer.

E os pais também precisam cada vez mais de conhecer o mundo dos filhos, esse é um direito pelo qual têm de lutar. Devo confessar que, para alguns progenitores, o espaço e o tempo junto dos mais novos é vivido como uma maçada: saturados pelo trabalho, querem nos tempos livres estar com os amigos ou sem fazer nada, mas a verdade é que é crucial entrar no mundo dos mais novos. O mundo das crianças e dos jovens é agora tão determinado por forças fora da família (amigos, escola, Internet, televisão…) que quem não luta para entrar nesse mundo fica mesmo de fora. E quando se trata de questões de segurança ou saúde, o dever de intervir dos pais é inalienável: por isso não há outra solução se não a de reconectar filhos e pais, de todas as maneiras que for possível.

Quando os filhos não estão bem, os pais têm o direito de actuar: devem começar por reduzir as críticas, mostrar afectividade e empatia, descobrir um interesse do filho mais ou menos oculto, mas que pode ser potenciado. É um direito dos pais exigir a atenção dos filhos, embora com respeito pela sua privacidade: tudo se poderá resolver se ambas as gerações souberem contar as suas experiências em termos afectivos, não adiando uma conversa que poderá ser esclarecedora.

O século XXI vai ser o da importância do privado, como sempre aconteceu em épocas de crise: por isso a parentalidade responsável e criativa é um dos grandes desígnios do nosso tempo.

Daniel Sampaio

Em Revista Pública de 1 de Março de 2009

(NOTA: O sublinhado é nosso)

ESCOLA E FAMÍLIA: QUE DIÁLOGO?


Quem pertence à geração que anda pelos 50 anos que recebeu a herança da escola salazarista, em particular nos meios rurais, reconhece facilmente a distância do seu modelo educativo face ao actual: naquele tempo, os pais iam à escola a medo, de chapéu na mão, mais as mães que, sobretudo elas, eram as interlocutoras naturais dessa suprema autoridade que era “a professora primária”. A escola era um edifício inóspito, vazio de mobiliário, tirando as carteiras, com os inevitáveis tinteiros de porcelana branca encaixados, dois a dois, entre as ranhuras para depositar as penas,

aqueles derramadores de borrões de tinta que nos “tatuavam” os dedos e os cadernos, nos intervalos das cópias, dos ditados ou das terríveis contas de dividir por cinco, com vírgulas. Além da secretária da “mestra” decorada com a régua, a cana “de apontar” no quadro negro, e alguns objectos mais ou menos decorativos pessoais, pouco mais restava que uns mapas coloridos do Portugal “Continental, Insular e Ultramarino”. Talvez o crucifixo ao centro da parede, por cima do quadro.

O resto era as nossas presenças, de pobres alunos, feitos destinos vulneráveis de um país de mistérios, de sombras e de rezas. Estávamos ali, à espera de ser gente com pressa de ficar aptos para trabalhar, para fugir daquele lugar estranho, onde não havia campos, pássaros ou ninhos e todas as sensações visuais, auditivas ou tácteis se associavam a estímulos condicionados de bolos, reguadas e tantos outros castigos físicos.

E, no entanto, se todos tivemos que atravessar essa imensa e institucionalmente pouco solidária manhã submersa, não podemos limitar esta etapa crucial do desenvolvimento da nossa personalidade à ideia sonâmbula de um certo rosário de tormentos. Isso não! Nós fomos protagonistas de aprendizagens múltiplas que digerimos e transmutámos em valores. Em particular todos aqueles valores sociais e políticos que constam do apego à liberdade, à democracia participativa, à solidariedade, ao desenvolvimento corporizado naquele estribilho do Sérgio Godinho que dizia “a paz, o pão, habitação, saúde, educação...só há liberdade a sério quando houver...”. É oportuno recordar tudo isto agora, por estes tempos em que campeia um individualismo feroz, onde parece que tudo rola segundo os esquemas mecânicos do mercado, isto é, do vil metal, e onde a realidade mais rica, autêntica e realizante que é a pessoa, entendida como sujeito de dignidade, parece ter-se esfumado.

Neste contexto, como é que devemos encarar a educação? Que perspectivas de valores a transmitir aos mais novos? Quais as nossas prioridades? Ensiná-los a ser gente mentalmente asseada, respeitadora, honrada, capaz de saber comprometer-se, de ser fiel à palavra dada, de saber usar, como diziam os mais antigos, “uma camisa lavada”? Penso que objectivamente todos os pais pretendem desenvolver nos seus filhos uma personalidade equilibrada e matizada por um sistema de atitudes gerador de procedimentos de integração na vida colectiva, em ordem a uma sociedade portuguesa globalmente melhor e progressiva. Mas há tantos obstáculos, tanto telelixo a barrar o caminho do diálogo no seio da família que temo que tudo não passe de meras intenções. A família vê reduzir-se o seu campo de manobra no processo de socialização, “atirando” para a escola cada vez mais exigências nestes campos. Como pode esta assumir a tarefa de transmitir valores cívicos, éticos, políticos? Tem que o fazer com toda a urgência disso não poderá restar qualquer dúvida, sob pena de uma rápida desintegração do tecido colectivo. E já vamos tendo alguns alarmantes sinais, em particular no que toca ao desrespeito pelos outros, na estrada, na rua, onde quer que seja; ou na dificuldade que os jovens parecem sentir em aceitar assumir regras que nos cumpre a todos defender e partilhar...

Ora, só propugnando um acréscimo de diálogo entre escola e família, fazendo deste binómio uma realidade viva e dinâmica, poderemos estar seguros de que o mundo caminhará no sentido do progresso social, dos grandes valores por que toda a nossa geração lutou e luta, pelo menos desde há trinta anos. E há muitas estratégias para conseguir esta comunicação, a questão está em pedir a ambas alguma abertura e imaginação, conjugadas com boa vontade de parte a parte. Com a consciência de que não será nada mau começar, ó pais e professores, por ler alguma coisinha: há por aí tanto livrinho, jornais e revistas bem interessantes. Ou se quiserem convidar “individualidades”, há algumas que vão sempre: “convoquem” o Prof. Daniel Sampaio que esse nunca falta!


José Melo


PRIMAVERA


Nem é preciso convocar o Coro Trágico de Bacantes e das Ménades,

Para celebrar, ao som de mil danças juvenis, às cintilações alegres,

A chegada de Perséfone pela mão de sua mãe Deméter, viva e fera!

Vivamos a renovação de todos os sentidos,

Na cadência de uma nova madrugada.

Estamos na hora da flor, da poesia, da cor e do beijo!

A sensualidade desceu à terra e despenteou-nos os cabelos:

Já não estamos em idade de sermos velhos,

Mas de cantarmos, de cheirarmos o azul,

De prendermos o mar, para sempre, aos nossos sonhos,

Pintando neles gaivotas e música com ritmos novos!

Porque a vida faz-se do Amor, numa urgência oficinal,

Cumprindo o eterno mandamento do Fogo,

Seguindo o velho desígnio de Prometeu agrilhoado;

Subamos hoje à montanha onde cresce a árvore frondosa

Da Poesia, essa coisa alegre que nos faz gente!

JOSÉ MELO – 21 /03/06.