Fazer da Escola, da "nossa Soares" a nossa Casa! -Eis o melhor e o maior desígnio para um acto comemorativo digno e consistente destes 125 anos, verdadeiro exercício de vida, de acção, de aprendizagem, de criação, de movimento perpétuo, ponto de encontro de vontades, encruzilhada de Tradição e de Inovação, fórum de Sentidos e Experiência de Sedução de almas e corpos, abertos à usura do Tempo.
Espaço de modernidade, fonte permanente de mil estimulações, abertura a um mundo de possíveis, sempre a Soares dos Reis tem sido, ao longo de gerações, a oficina quotidiana do Deslumbramento, o brilho nos olhos da Inquietação, a certeza partilhada desta Comunidade de gentes nortenhas que, de cara lavada, sabe conjugar como ninguém o significado das palavras Arte e Amor. Que rima com suor, sacrifício e dedicação de muitas e muitos que, de dia ou de noite, numa "escola prática" de "arte aplicada" ou de "artes decorativas", chamando-se "Industrial Faria Guimarães" ou mais tarde "Soares dos Reis", a nossa "Casa Comum" foi e há-de continuar a ser o exercício da cidadania e da abertura permanente aos ideais do Progresso que germinaram e hão-de continuar a fazer germinar a construção das ideias, a criação e o desenvolvimento dos projectos, a dinamização cultural e artística da cidade do Porto e da sua área metropolitana. Basta recordar que foi um antigo aluno, falecido há cerca de um ano, nome grande das artes nacionais, Jaime Isidoro, que lançou no Porto a primeira galeria, a Alvarez!
E quantos nomes notáveis de artistas plásticos, de arquitectos, de cabouqueiros anónimos da Beleza ou da não-Beleza, artífices de um mundo sempre renovado pela humana vontade de aceder a níveis de Representação e de Formas superiores, libertas das negritudes e das sombras do infra-mundo caótico e invisível! Foram autênticas legiões de criativos das mais diversas expressões plásticas, desde a moda, a ourivesaria, o design de mobiliário, a cerâmica, as artes gráficas até à fotografia e ao cinema (recorde-se o nome de Luís de Pina) que deram ao nosso país, por via das suas práticas de aprendizagem e/ou (tantas vezes as duas coisas em sequência) de ensino, o melhor de si próprios, da sabedoria e da genialidade de que foram capazes…
Não podemos ficar obviamente presos à impressão multicolor que esta magnífica rosácea pedagógica que esparge a luz de um passado glorioso de 125 anos nos vem trazendo! Aceitemos o peso institucional das eras passadas e sua glória, sem deixarmos de ter saudades do futuro. Sabemos que o mundo vive hoje num estado de revolução permanente de conceitos, de práticas, de estilos, de semânticas, de atitudes e de valores…não apenas ao nível das comunicações e das expressões, mas também daquilo que os estímulos e as representações icónicas e eidéticas nos enformam os circuitos neuronais e os sistemas de organização social e de pertença ou de poder…
Temos de acreditar na mudança. Na nossa. Endógena. Com persistência e teimosia. Para mais e melhor Não fosse o exercício da nossa profissão de educadores de aprendizes de Arte um ponto axial de Utopias várias com o Entusiasmo da aula iniciática, primordial.
Das discussões e reflexões havidas e a haver em torno da "Nova Soares", do seu Projecto Educativo e da sua "especificidade" estará, a meu ver, a garantia da prevalência de Fernando Pessoa sobre Oliveira Martins. Esclareça-se: No velhinho edifício da Rua Firmeza está um mural da Mensagem: "Deus quer, o homem sonha, a obra nasce". Algures, num canto escondido do novo edifício da EASR, "resiste" um relevo escultórico, representando o antigo patrono, Oliveira Martins, acompanhado de um seu "pensamento" seguramente descontextualizado: "hoje não vou sonhar, vou aprender".
Creiamos, porém, nas virtudes de um "diálogo" de compromisso entre os dois vultos das letras lusas: porque não fazer a obra nascer a partir da aprendizagem do sonho? Pois não foi Shakespeare que avisou a Humanidade que "We are such stuff as the dreams are made"?
José Melo (Prof de Filosofia)
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